Bode expiatório
Gotas Olímpicas
Por: Ricardo de Moura
Data: 16/SET/2023
Conhecendo um pouco de como funcionam “os bastidores do esporte internacional”, eu já havia confidenciado a alguns amigos, há algum tempo, que os nadadores da Russia e da Bielorussia tinham chance de participar dos Jogos Olímpicos de Paris 2024.
Tive a oportunidade de fazer parte do Comitê Técnico de Natação da Federação internacional por 12 anos. Isso proporcionou uma forma diferente de pensar sobre o esporte.
Fez parte desse Comitê comigo, o ex-campeão olímpico e recordista mundial, Vladimir Salnikov. Hoje ele faz parte do Bureau da World Aquatics e é presidente da Federação Russa de Natação. Salnikov é o reflexo de como era quando nadador.
Obstinado, consistente, disciplinado e persistente.
Eu imaginava que ele iria arrumar um jeito de convencer as autoridades a autorizarem a participação dos nadadores russos nos próximos eventos da World Aquatics e, com isso, abrir uma porta gigantesca para competir em Paris 2024.
A World Aquatics estabeleceu, recentemente, diretrizes para a participação de atletas russos e bielorrussos em seus eventos, inclusive o Campeonato Mundial de Doha 2024, mas identificou vários atos que manteriam a inelegibilidade de um atleta para competir nas suas competições. Entre elas, a demonstração de apoio à guerra russa contra a Ucrânia.
O bicampeão olímpico dos Jogos de Tóquio de 2020, Evgeny Rylov, apareceu em um comício em março para o presidente russo Vladimir Putin, e essa decisão impedirá Rylov de competir no cenário internacional. Rylov, campeão dos 100 metros e 200 metros costas em Tóquio, e ganhou 15 medalhas em Campeonatos Mundiais – tanto em piscina longa quanto em piscina curta.
Com essa decisão, a World Aquatics “mata dois coelhos com uma cajadada só”: atende politicamente a uma parte da comunidade que reivindicava a participação dos nadadores russos e bielorrussos (uma pesquisa apontou que mais de 60% da comunidade apoiava a participação) e dá um exemplo de “punição” a um atleta consagrado, evidenciando que não apoia a guerra/invasão.
Sou contra a invasão e a guerra. A omissão do mundo sobre isso me incomoda muito. São todos coniventes e convenientes.
Só que me dá a impressão que Rylov entrou de “bode expiatório” na história.
Ficou mais perigoso falar que pensar. Só que, o que precede uma ação é o pensamento, não a fala.
#esporte #Paris2024 #russia #Bielorrusia #bodeexpiatorio
Ricardo de Moura
Gestor esportivo com mais de 40 anos de experiência em Projetos Esportivos.
Supervisor/Superintendente da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos por 28 anos.
Participou de 7 edições dos Jogos Olímpicos, 7 edições de Jogos Pan-americanos e 25 Campeonatos Mundiais. Responsável por projetos que levaram à conquista de 10 medalhas olímpicas na natação. Integrante do Comitê Técnico de Natação da Federação Internacional de Natação por 12 anos.
Secretário-tesoureiro da Confederação Sul-americana de Natação.
Professor do Curso Avançado de Gestão Esportiva do Comitê Olímpico Brasileiro de 2009 a 2017.
Escritor do livro “Gotas Olímpicas” – 2022.
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